Quem lembra desse episódio que amplamente foi divulgado na mídia, em especial no Jornal O Globo, quando acusaram o Juiz João Carlos Corrêa de abuso de autoridade ao dar voz de prisão a uma Agente da Lei Seca no Rio?
Pois bem, acusaram o magistrado por diversos abusos inexistentes naquela ocasião. Mas, como diz o ditado: a justiça tarda mais não falha!
Vejam a íntegra da sentença:
JUÍZO
DE DIREITO DA 36ª VARA CÍVEL DA COMARCA DA CAPITAL PROCESSO Nº:
0176073-33.2011.8.19.0001 SENTENÇA Trata-se de ação ordinária ajuizada por
LUCIANA SILVA TAMBURINI contra JOÃO CARLOS DE SOUZA CORREA ao argumento de que
em 12/02/2011 estava trabalhando na ´Operação lei seca´ na Av. Bartolomeu Mitre
em frente ao nº 1600 quando foi determinada a parada do carro dirigido pelo
réu; que o réu estava sem habilitação e que o veículo estava sem registro, sem
placa e com nota fiscal datada de 19/01/2011; que ao ouvir a autora dizer que o
veículo seria apreendido o réu mostrou desconhecer a proibição de trafegar após
o período permitido; que a autora ficou surpresa; que o réu afirmou a autora
que apenas entregaria o carro na presença de um delegado de polícia; que o réu
deu voz de prisão à autora e mandou que ela entrasse na viatura a fim de seguir
para a DP momento no qual a autora disse que o réu não era Deus; que o réu
retirou o veículo da tenda da operação e representou contra a autora junto a
Procuradoria Geral da Justiça; requer a condenação do réu ao pagamento de 41
salários mínimos a título de danos morais, bem como a condenação do mesmo aos
ônus da sucumbência. Inicial instruída com os documentos de fls. 14/52. Citado,
o réu apresentou a contestação de fls. 60/68 acompanhada dos documentos de fls.
69/74 alegando que a autora dispensou ao réu tratamento grosseiro apesar de
saber que o autor é magistrado; que o réu fez o exame de etilômetro cujo
resultado foi negativo, sem que tenha até então se identificado; que a sua
esposa levou a carteira de habilitação até o local; que a liberação do veículo
demorava em razão da ausência de placa; que neste momento a autora dirigiu-se
ao réu e disse ´mas você é juiz de direito e não conhece a lei?´; ainda
voltando-se para os agentes a autora disse ´que pouco importava ser juiz; que
ela cumpria ordens e que ele é só juiz não é Deus´; que como a autora
continuava a hostilizar e debochar do réu, este deu-lhe voz de prisão por
desacato; que a autora desconsiderou a ordem e voltou á tenda, e somente após
dirigiu-se à autoridade policial na DP onde restituiu a carteira de motorista
ao réu e este entregou o veículo á autoridade; que o autor agiu no exercício
regular de um direito; que inexiste dano moral; requer a improcedência do pedido.
Reconvenção ás fls. 76/80 alegando que a reconvinda / autora dispensou ao
reconvinte/ réu tratamento grosseiro apesar de saber que o autor é magistrado;
que o reconvinte/ réu fez o exame de etilômetro cujo resultado foi negativo,
sem que tenha até então se identificado; que a sua esposa levou a carteira de
habilitação até o local; que a liberação do veículo demorava em razão da
ausência de placa; que neste momento a reconvinda/autora dirigiu-se ao
reconvinte/réu e disse ´mas você é juiz de direito e não conhece a lei?´; ainda
voltando-se para os agentes a autora disse ´que pouco importava ser juiz; que
ela cumpria ordens e que ele é só juiz não é Deus´; que como a
reconvinda/autora continuava a hostilizar e debochar do reconvinte/réu, este
deu-lhe voz de prisão por desacato; que a autora desconsiderou a ordem e voltou
á tenda. Requer a condenação da reconvinda ao pagamento de indenização por
danos morais. Contestação à reconvenção às fls. 96/102 firmando que o autor
pretendia tratamento diferenciado; que não teve dolo de injuriar;; que ao
compará-lo a Deus o fez após o ato de prisão; que nunca fora detida; requer a
improcedência do pedido. ´Réplica´ às fls. 103/108. Instadas a se manifestarem
em provas às fls. 109 as partes assim o fizeram às fls. 110 e 112. Decisão de
saneamento às fls. 115. O autor juntou documento às fls. 116/139. Ata da
audiência de instrução e julgamento ás fls. 149 oportunidade na qual as partes
concordaram em acolher os depoimentos colhidos em desde administrativa.
Alegações finais às fls. 160/167 e 168/173. Vieram-me os autos conclusos. É o
Relatório. Decido. Pretende a autor a condenação do réu ao pagamento de
indenização por danos morais ao argumento de que o mesmo lhe deu voz de prisão
na Operação lei Seca oportunidade na qual estava trabalhando, sendo certo que o
autor estava sem habilitação e com o carro sem placa e com a licença vencida.
Ultimada a fase instrutória, apurou-se que: (i) o autor foi parada na operação
lei seca; (ii) estava sem a habilitação; (iii) submeteu-se ao etilômetro com
resultado negativo ; (iv) a autora afirmou que o autor desconhecia a lei e que
não era Deus; (v) ainda na operação a carteira de habilitação do autor foi
trazida; (vi) verificou-se no sistema do DETRAN que as placas do carro estavam
confeccionadas; (vii) o carro foi liberado. As frases ´mas você é um juiz de
direito e não conhece a lei?´ e ´que pouco importava ser juiz´ e ´ela só
cumpria ordens´ e ´ele é só Juiz e não é Deus´ foram ditas pela autora e este é
fato incontroverso, diante da admissão pela mesma que, de fato, proferiu estas
afirmações. A prova oral colhida no processo administrativo e que passou a
integrar esta ação cujos termos de depoimentos estão às fls. 153/157 dão conta
de que durante todo o episódio o réu foi cortês e educado, ao passo que a
autora deu ao réu tratamento descortês e irônico. Esta certamente a razão da
ordem de prisão a ela dirigida em razão da configuração do crime de desacato.
Não há nos autos nada que comprove ter o réu atingido a honra, a imagem e a
dignidade da autora que, não se sabe por que ficou tão irritada e proferiu as
frases acima declinadas. Foram as atitudes da própria autora que determinaram a
sua condução à Delegacia de Policia. Portanto, não deve ser acolhido o pedido
da autora, ante a ausência de prova de conduta culposa do réu, o que impede o
nascimento do dever de indenizar. No tocante à reconvenção, cuja causa de pedir
é a atitude grosseira, desrespeitosa e descortês da reconvinda, apesar de
existir apenas uma única infração de trânsito, qual seja a licença de
para-brisa vencida, entendo que as frases proferidas pela reconvinda tiveram a
intenção de diminuir o reconvinte na frente dos demais agentes da operação.
Questionar o reconvinte acerca do seu conhecimento, ou melhor, desconhecimento sobre
a lei tem apenas um objetivo: expô-lo ao ridículo. Afirmar que o reconvinte não
é Deus revela clara intenção de deboche. A reconvinda perdeu a razão ao
ironizar o autor e repita-se as condutas de ambos estão perfeitamente
comprovadas na ação pelos depoimentos das testemunhas e, ainda, não são negadas
pelas partes. Na fixação do valor do dano levarei em consideração o princípio
da razoabilidade a fim de evitar o enriquecimento ilícito da vítima. Isto
posto, na ação principal JULGO IMPROCEDENTE o pedido e em consequência,
resolvido o mérito, na forma do art. 269, I do CPC. Condeno a autora ao
pagamento das custas e honorários que arbitro em R$ 1.000,00 (um mil reais), na
forma do art. 20, § 4º do CPC. Na reconvenção, JULGO PROCEDENTE o pedido para
condenar a reconvinda ao pagamento de indenização por danos morais que arbitro
em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a serem corrigidos monetariamente pelos
índices da CGJ a partir desta data e acrescidos dos juros legais desde
12/02/2011, e em consequência, resolvido o mérito, na forma do art. 269, I do
CPC. Condeno a autora ao pagamento das custas e honorários que fixo em 10%
sobre o valor da condenação. Transitada em julgado, certifique-se.
Transcorridos 30 dias sem que nada tenha sido requerido, na forma do art. 229-A,
§ 1º, inciso I da Consolidação Normativa da Corregedoria Geral de Justiça
remetam-se os autos a Central ou Núcleo de arquivamento do 1º NUR. P.I. Rio de
Janeiro, 05 de fevereiro de 2014. ANDREA QUINTELA JUIZ DE DIREITO.