O Ministério Público propôs arquivamento da
presente investigação policial, aduzindo para tanto os fatos e fundamentos
descritos na minuciosa manifestação contida as fls. 110/116, os quais adoto
como parte integrante do presente relatório.
A presente manifestação foi lastreada a partir do inquérito
apensado, de nº: 901/00679/2012/01/2013 desenvolvido pela Delegacia de
Homicídios do Estado (DH), onde foram juntadas todas as peças técnicas colhidas
na ocasião.
Parecer pelo Desarquivamento do inquérito as
fls. 03/16.
Determinação de desarquivamento por parte do
Exmo. Sr. Procurador Geral de Justiça a fl. 17.
Laudo Pericial da Coordenadoria de Segurança e
Diligência do MP do Estado do Rio de Janeiro as fls. 18/107.
Imagens do confronto as fls. 120/132.
Relatório de Análise de Monitoramento da
Associação Criminosa promovida pelo DPF/DRE, da Polícia Federal, onde os
envolvidos foram investigados na operação denominada “Galileu” as
fls. 133/438.
Este é o breve exame do caderno processual, que
aqui tomamos à guisa de RELATÓRIO
Examinados, passamos à MOTIVAÇÃO &
DECISÃO.
“De tanto ver triunfar as nulidades; de
tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça. De tanto ver
agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar-se da
virtude, a rir-se da honra e a ter vergonha de ser honesto.” Rui Barbosa.
Preliminarmente, peço venia aos argumentos
esposados pelos Ilustrados Membros do Ministério Público deste Estado para
afirmar que, dentro da minha ótica jurídica, o desarquivamento promovido agrediu a coisa julgada constitucional, instituindo verdadeiro e efetivo ataque aos direitos e
garantias individuais dos policiais investigados!
O inquérito policial foi instaurado
legitimamente pela Autoridade Policial, primeira juíza documental do
fato, através da Portaria contida a fl. 02 do Inquérito apensado ao
presente procedimento ministerial, deflagrando-se, a partir daí, intensa e idônea atividade investigativa na busca
da verdade real e/ou de indícios mínimos de autoria de crime, já que a materialidade estava estampada no laudo de fls. 123/135.
Após largo período de investigação, a zelosa
Delegada Elen Gomes, demonstrando
profundo e indiscutível conhecimento das peças colhidas, elaborou
minucioso enfrentamento das provas indiciárias concluindo, a meu ver admiravelmente, pelo reconhecimento da excludente de
antijuridicidade prevista no Inciso II, do Art. 23 do Código Penal.
Novas provas, de toda sorte foram anexadas as
fls. 143/216, entretanto, tais elementos indiciários apenas robusteceram a tese sustentada pela
Exma Delegada de Polícia, motivo pelo qual sua colega, mais uma vez, a
meu ver de forma correta, reiterou o relatório sustentando
a mesma tese (fl. 218).
Diz o dispositivo focado pela Autoridade
Policial:
“Art. 23 - Não
há crime quando o agente pratica o fato: (Redação dada pela Lei nº
7.209, de 11.7.1984).
I - em estado de necessidade; (Incluído pela Lei
nº 7.209, de 11.7.1984).
II - em
legítima defesa; (Incluído pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) (...)”
(grifei).
A investigação foi submetida ao Órgão
Constitucionalmente estabelecido para garantir os interesses da sociedade,
opinando este, através da Dra. Valéria Videira, Promotora de Justiça conhecida pelo seu rigor no trato com desvios,
pelo arquivamento.
Valéria Videira investiu oceanos de tinta ao
longo de quatro laudas para convencer, ante aos insuperáveis
elementos de prova técnicos contidos, o acerto da ação policial, reafirmando a existência da excludente de antijuridicidade estabelecida
no Art. 23 do CP, assim como se vê as fls. 222/226.
Não foi por razão diversa a sua conclusão;
vejamos
“(...) ante a ausência de justa causa, com fulcro no artigo 395, inciso III,
do Código de Processo Penal, o Ministério Público vem promover o arquivamento dos
inquéritos policiais.” (fl.
226 – grifos no original).
Em razão dos argumentos externados pela Dra
Promotora ao longo da sua promoção de fls. 222/226, os quais torno parte
integrante da presente decisão, não resta dúvida de que também ela reconheceu a
idoneidade da ação policial.
Destaco, a seguir, o dispositivo procedimental
expressado pela Presentante do Parquet:
“Art. 397. Após o cumprimento do disposto no art.
396-A, e parágrafos, deste Código, o juiz deverá absolver sumariamente o
acusado quando verificar: (Redação dada pela Lei nº 11.719, de 2008).
I - a existência manifesta de causa excludente
da ilicitude do fato; (Incluído pela Lei nº 11.719, de 2008).
II - a existência manifesta de causa excludente
da culpabilidade do agente, salvo inimputabilidade; (Incluído pela Lei nº
11.719, de 2008).
III - que
o fato narrado evidentemente não constitui crime; ou (Incluído pela Lei
nº 11.719, de 2008).(...) “(grifei).
Submetida a tese policial/ministerial ao crivo
fiscalizador do Poder Judiciário, reiterou este,
através da pena da ínclita Magistrada Elizabeth Machado Louro, os argumentos do Parquet, determinando, a seguir, o imediato arquivamento do feito através
da decisão de fl. 227.
Repousava este inquérito nos arquivos quando uma
suposta briga interna – fato externado pela mídia – acendeu
uma onda de “denuncismo” contra a equipe de elite da Polícia
Civil Carioca.
Deflagrada uma verdadeira “caça as
bruxas”, os investigados viram, a meu aviso, rasgados os seus direitos e
garantias individuais para satisfazer
alguns oportunistas de ocasião.
“A prática da cidadania só adquire sentido se no
seu horizonte estão os direitos de todos, a igualdade perante a lei, a defesa
do bem comum”
José Batista Libânio
Dotados, infelizmente, de voz
pública, ignoraram estes a regra de isonomia de direitos e garantias determinados por imperativo
constitucional pétreo; qual seja, o previsto no caput do Art.
5º da CRFB/88:
“(...) Art.
5º Todos são iguais perante a lei,
sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e
aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à
liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)” (grifei)
Policiais, com todo respeito e, me perdoem o adágio popular empregado, não “nascem de chocadeiras”.
Muito pelo contrario, são filhos gerados e amados, pais adorados, amigos leais;
enfim, seres humanos como todo e qualquer um que habita o planeta!
Portanto, por mais odioso que possa soar, tem os policiais também garantidos pela
Constituição da República os mesmos direitos humanos tão
festejadamente reclamados para os criminosos!
Quando determinado o trancamento da investigação reconhecendo-se a não caracterização de crime,
com todo respeito ao entendimento ministerial esposado as fls. 03/17, se efetivou a coisa julgada, constituindo
o desarquivamento, peço mais venias, verdadeira agressão aos direitos e garantias individuais dos
cidadãos/policiais investigados.
Paulo Rangel, dissertando sobre o tema nos
ensinou no seu “A Coisa Julgada no Processo Penal Brasileiro como Instrumento
de Garantia”, da Editora Atlas, 2012, o seguinte:
“No processo penal o caso julgado irá recair sobre o fato real ocorrido no mundo dos homens.
Não se trata da declaração da sentença sobre uma qualificação jurídica do fato,
pois se assim fosse poderia o Estado acusar, novamente, o indivíduo já julgado,
dando a outro nome àquele fato que já foi objeto de julgamento. Talvez seja
esta a razão através da qual alguns julgados tenham permitido a renovação de
processo contra o mesmo réu, pelo mesmo fato.” (Fl. 160 - grifei).
Contra os argumentos até aqui externados
poder-se-ia dizer. Ora! Trata-se de mero arquivamento de uma investigação, onde
não há devido processo penal, instruído sob o contraditório, portanto, possível
à incidência do verbete 524 das Súmulas do STF, até porque se trata de mero
despacho, sem carga jurisdicional plena.
Há forte entendimento nesse sentido; não nego!
Todavia, a meu juízo trata-se de entendimento
verdadeiramente inquisidor, pois dito verbete foi firmando nos idos de 1969,
onde os “anos de chumbo” encontravam seu maior eco na nossa
sociedade.
De lá para cá muitas coisas se modificaram, especialmente após a edição da CRFB/88,
grande marco divisor entre a inquisição e a democracia.
Naquele período, parece brincadeira, o
investigado era “mero objeto da investigação”, ou seja, tinha
banida a sua cidadania quando submetido a reles investigação
policial. Hoje, é inegavelmente “sujeito de direitos”.
Atualmente nem mesmo o in dubio pro
societate encontra a força de outrora nessa fase, assim como destaca
André Nicolitt:
“Questão interessante refere-se ao chamado
princípio in dubio pro societate. Sustenta-se que na fase do inquérito, ao
contrário do que ocorre no processo onde vigora o in dubio pro reo, a dúvida
favoreceria a sociedade, sendo assim, havendo dúvida o Ministério Público deve
denunciar. A exigência de um
processo penal democrático, no contexto de um Estado Democrático de Direito,
consciente dos efeitos deletérios do processo sobre a pessoa humana, não se
harmoniza com a máxima in dubio pro societate.” (In. Manual de Processo
Penal, 4ª Ed. Campus Jurídico, 2013, Fl. 97 - grifei).
Bastam estes argumentos para se ter em mira, com
todo respeito aos entendimentos divergentes, a certeza de que arquivada uma investigação reconhecendo-se a
atipicidade da conduta e/ou a existência de uma excludente de antijuridicidade,
operada está, excepcionalmente, a
coisa julgada.
Isso porque, tal qual a atipicidade, as excludentes de ilicitude afastam a
caracterização do crime, fato bem lembrado por Nelson Hungria:
“Tanto na legítima defesa, quanto no estado de necessidade, não há crime, o que vale dizer: o fato é objetivamente lícito” (In. Comentários ao Código Penal , 1 V, p. 92).
A doutrina moderna mantém o mesmo entendimento,
tal como se vê a seguir:
Toda ação compreendida em um tipo de injusto (doloso ou culposo) é
ilícita se não está presente uma causa de justificação. Tem-se, pois, que a
existência de uma causa justificante faz da ação típica uma ação lícita
ou permitida ” (In. Luiz Regis Prado, Comentários ao Código Penal,
RT, 8ª Ed., 2013., p. 132).
Após, reitero, profunda e responsável
investigação, duas Delegadas de Polícia e a Promotora de Justiça
afirmaram, com base em prova técnica, se tratar de conduta onde inexistia crime (fl. 226). Logo,
não há como acatar arquivamento e quiçá nova investigação.
Nesse sentido, veja-se a jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal:
“Trancamento de Inquérito por Atipicidade
e Coisa Julgada
A decisão que determina o arquivamento do inquérito
policial, a pedido do Ministério Público, quando o fato nele apurado não
constituir crime, produz, mais que preclusão, coisa julgada material, impedindo
ulterior instauração de processo que tenha por objeto o mesmo episódio,
ainda que a denúncia se baseie em novos elementos de prova. Nesses
termos, a Turma deferiu habeas corpus impetrado em favor de
ex-prefeito condenado pela prática do crime previsto no art. 1º, II, do
Decreto-lei 201/67 (“Art. 1º -... II – utilizar-se, indevidamente, em
proveito próprio ou alheio, de bens, rendas ou serviços públicos.”),
consistente no desvio de finalidade de recursos, advindos de convênio
entre Município e o Ministério do Bem Estar Social, para o pagamento de obra
diversa da pactuada, com o fim de ensejar benefício à empreiteira.
Considerando a identidade dos fatos pelos quais o paciente fora
processado e julgado com aqueles que já teriam sido objeto de anterior
inquérito policial, arquivado por determinação do Tribunal de Justiça
estadual — em decisão, não recorrida, que analisara o mérito e concluíra
pela atipicidade do fato —, a Turma entendeu que a instauração de ação
penal pelo Ministério Público Federal, sob o fundamento de que teriam
surgido novas provas a justificar o recebimento da denúncia na Justiça Federal,
violara a coisa julgada. Salientou que, não obstante a decisão de
arquivamento tivesse sido prolatada pela justiça comum, absolutamente
incompetente para o caso, já que o delito imputado é ofensivo a interesse da
União, os seus efeitos não poderiam ser afastados, sob pena de reformatio
in pejus indireta. Habeas corpus deferido para
trancar o processo condenatório. Precedentes citados: HC 80560/GO (DJU
de 30.3.2001 e RTJ 179/755); Inq 1538/PR (DJU de 14.9.2001 e RTJ
178/1090); Inq 2044 QO/SC (DJU de 8.4.2005) e HC 80263/SP (DJU de
27.6.2003 e RTJ 186/1040). HC 83346/SP, rel. Min.
Sepúlveda Pertence, 17.5.2005. (HC-83346)
Arquivamento de Inquérito Policial. Atipicidade. Coisa
Julgada Material. Não é possível a reabertura de inquérito policial quando este
houver sido arquivado a pedido do Ministério Público e mediante decisão
judicial, com apoio na extinção da punibilidade do indiciado ou na atipicidade
penal da conduta a ele imputada, casos em que se opera a coisa julgada
material. Com base nesse entendimento, a Turma deferiu habeas corpus para
determinar o arquivamento definitivo de inquérito policial instaurado contra
acusado da suposta prática de homicídio. No caso concreto, o inquérito policial
havia sido arquivado por decisão do juízo de primeira instância, a requerimento
do Ministério Público, sob o fundamento de inexistência de fato típico
perseguível mediante ação penal, tendo em conta que ficara constatado, por meio
da reconstituição do crime, do exame pericial de uma mão de pilão, objeto de
maceração encontrado próximo ao local do crime, e da exumação do corpo da
vítima, que esta teria morrido em decorrência de um acidente, provavelmente de
um coice de animal. O Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso havia
reformado a decisão, em sede de apelação interposta por parentes da vítima, e
determinado o desarquivamento do inquérito com vistas à reabertura das
investigações. Ressaltou-se que não se poderia reiniciar a investigação penal,
ainda que se admitisse a possibilidade de reabrir inquérito policial arquivado
com base na atipicidade penal, porque, no caso, o pedido de desarquivamento não
fora fundado em provas substancialmente novas, mas se voltava para análise do
mesmo exame pericial, havendo de incidir o enunciado da Súmula 524 do STF
(“Arquivado o inquérito policial, por despacho do juiz, a requerimento do
promotor de justiça, não pode a ação penal ser iniciada, sem novas provas.”).
HC 84156/MT, rel. Min. Celso de Mello, 26.10.2004.
Ao optar pelo arquivamento calcado no inciso III, do Art. 397 do CPP (fl. 222/226); opção esta
afirmada pela Magistrada Titular a fl. 227, o Ministério Público criou situação jurídica para os sujeitos de
direitos investigados intransponível, assim como nos lembra Eugenio
Pacelli de Oliveira:
“Nesse ponto, remetemos o leitor ao exame que fizemos do princípio
da vedação da revisão pro societate, retro, no qual assentamos que,
independentemente da fase procedimental, incluindo a fase de investigação, e
independentemente de sua designação legal, a decisão judicial que resolver a
questão de mérito do caso penal produzirá efeitos de coisa julgada material, ainda que
proferida por juiz absolutamente incompetente. É o caso do arquivamento, quando fundado em atipicidade ou em extinção da
punibilidade, hipóteses de absolvição sumária do art. 397, III e IV CPP.”
(In. Curso de Processo Penal, 15ª Edição, Lumen Juris. 2011, Fl. 66 - grifei).
Inaceitável o Estado declarar a
inexistência de crime, criando situação
benéfica para os sujeitos de direitos investigados e, posteriormente este mesmo
Estado, ante agito sensacionalista, romper com os ditames constitucionais
desses mesmos sujeitos!
Volto a insistir, o MP foi enfático ao representar pelo
arquivamento. Disse ele se tratar de procedimento sem justa causa, destacando a ausência de crime, nos termos do
Art. 397, III, do CPP. Logo, não poderia ele próprio desdizer afirmação
anterior, sob pena de aplaudir o princípio da non reformatio in pejus.
Superada essa fase preliminar, passo ao mérito do tema.
A MATERIALIDADE restou demonstrada através dos laudos acostados
às fls. 123/135 do inquérito policial da DH apensado a presente investigação do
MP.
No tocante a pretensão Ministerial sobre o novo arquivamento,
passo a apreciar:
O que há de novo nesses autos? Nada!
Infelizmente o Brasil vive um momento sensacionalista, onde o
grande Big Brother vivido causa “escândalos” infindáveis! Aqui
não foi diferente!
Há de se ter, fria
e desfantasiosamente falando, em conta a seguinte certeza. Toda essa “caça
as bruxas” promovida contra os policiais foi deflagrada porque
chegaram à mídia as filmagens de mais uma operação policial.
Ora! A internet
externa milhares delas pelo mundo afora e, em cada uma que vi
nesses 40 dias de apreciação destes fatos, nada vi de diferente, especialmente nos confrontos ocorridos nos
países de primeiro mundo!
Não há qualquer justificativa razoável, plausível
e aceitável para se admitir facínoras em vias públicas, portando
armas de guerra, em motocicletas e/ou automóveis, trafegando em velocidade
excessiva e efetuando disparos a toda sorte!
Ao contrário do que vem se defendendo, infelizmente por uma forte corrente com voz
pública no Brasil, o
cidadão que paga impostos jamais
deve e/ou pode ser incomodado por criminosos.
Em países evoluídos é assim! A prioridade é sempre de quem vive na legalidade, paga impostos e defende a pátria. Quem se opõe deve ser
suprimido a qualquer custo porque se tal não ocorrer, o sistema se inverte, assim como vem
ocorrendo aqui.
Eis o que ocorre no Brasil! Temos um espírito elástico e nos
habituamos com o que é ruim. Isso é péssimo porque a criminalidade e o
sensacionalismo interpretam essa passividade como lacuna a ser ocupada no
espaço, promovendo então verdadeira inversão dos valores.
Nossa forma de viver passivamente ignora as sábias lições de Santo
Agostinho, para quem a esperança tem duas filhas, a indignação e a coragem. A
indignação, segundo ele, nos ensina a não aceitar as coisas como estão; a
coragem, a mudá-las!
“O homem que não luta pelos seus direitos não merece viver!”
Rui Barbosa.
Harvard Law School, tratando da situação
brasileira em detalhado estudo destacou:
“Só
se quebra o crime organizado na marra. Melhor a força inteligente do que
a força burra. O que importa é qualificar a polícia, como carreira
valorizada, e equipá-la com o que haja de melhor. Outras iniciativas
complementam a qualificação do aparato policial. Federalizar o combate ao
crime organizado e aos crimes de colarinho branco. Desarmar a população e
estatizar a indústria de armamentos. Unificar as polícias civis e
militares e multiplicar os recursos humanos e técnicos da Polícia
Federal. Reformar o processo penal
para impedir os criminosos bem representados de zombar de todos nós.
Agravar as penas e humanizar as prisões.” (grifei)
Quando aceitamos essa situação caótica instalada
no Estado, tal como estamos fazendo, tornamos nossos discursos meras falácias,
porque na verdade acatamos passivamente o abuso, a violência e o avanço
anarquizador dos criminosos e seus parceiros.
Rodrigo Constantino, colunista da revista Veja,
publicou recentemente o texto: “Esquerda Caviar”, de fácil localização em
qualquer sitio de procura na net. Lá encontrei um trecho de grande valia:
“Pois bem: a impunidade é o maior convite ao
crime que existe. Quando vocês
tratam bandidos como vítimas da sociedade, como se fossem autômatos incapazes
de escolher entre o certo e o errado, como se pobreza por si só levasse
alguém a praticar uma invasão dessas que você sofreu, vocês incentivam o
crime!”
Inobstante eventuais ideologias, não cabe aqui
debatê-las, a verdade estampada
pelo colunista é universal!
Criminosos devem ter seus direitos e garantias
protegidos, mas nunca canonizadas
as suas opções, até porque ao lado deles, nas mesmas comunidades, existem:
garçons, sapateiros, motoristas, entregadores etc. e, acreditem, todos tiveram as mesmas opções. Estes últimos, ao
contrário dos primeiros, elegeram e seguiram, apesar de todas as adversidades, o caminho da retidão.
Está na hora de dar voz e prestígio a eles!
Quando hipervalorizamos quem vive na ilegalidade, tal como vem ocorrendo, deixamos por mensagem implícita aos sofridos
e honestos trabalhadores que nada do que eles fazem é valido e, com
isso, instigamos a indústria do crime.
“Vamos festejar a inveja, a intolerância e a
incompreensão. Vamos festejar a
violência e esquecer a nossa gente, que trabalhou honestamente a vida Inteira e
agora não tem mais direito a nada. Vamos celebrar a aberração de toda a nossa falta de bom senso”.
(Renato Russo – grifei)
Este procedimento, a meu aviso, externa
justamente isso.
De um lado um criminoso contumaz, nocivo à sociedade, dono de um caráter
vivamente corrompido e violentíssimo, com seus discípulos, todos armados com
armas altamente letais, trafegando em velocidade superior a 100 km/h em vias
estreitas, ignorando leis, regras sociais e a vida das pessoas de bem.
Dono de uma fac com 25 laudas e 22 anotações por
crimes violentos, o criminoso alcunhado como “Matemático” era
uma das lendas da abandonada Zona Oeste.
Coincidentemente, coisas do destino, fui
Magistrado por nove anos naquela região e, muitas das condenações ali contidas
foram alcançadas em processos por mim conduzidos.
Até mesmo a operação de interceptação que gerou
toda essa investigação foi por mim determinada em procedimento produzido pela
Polícia Federal, com a fiscalização do MP.
“Matemático” era dono de um perfil impetuoso e destemido. Executava toda e qualquer pessoa capaz de lhe
contrariar. Não respeitava nada nem ninguém. Até membro do Ministério
Público ameaçou durante um plenário do Júri em Bangu.
Este criminoso era a perfeita caricatura das
figuras desenhadas por Oliver Thomson na sua obra: A Assustadora História da
Maldade.
Basta este resumo das feições deste delinquente
endógeno para se ter a certeza de que ele jamais voltaria ao cárcere, até
porque todas as tentativas anteriores de recaptura deste criminoso foram sempre cercadas de intensos tiroteios e
diversos óbitos.
Aqui não podia nem ia
ser diferente. O laudo de fls.
196/198 prova isso,
desmoralizando a verborragia insana causada na época da divulgação das imagens.
Está estampado no retrorreferido laudo as marcas de disparos promovidos contra a aeronave no dia do confronto;
disparos esses compatíveis com o material encontrado com o agressor “Matemático”,
assim como se vê no laudo de local de fls. 18/32, onde foram recolhidas
inclusive as cápsulas deflagradas no interior do veículo.
Todos os envolvidos nessa operação, assim como
toda e qualquer pessoa dotada de um mínimo de lucidez sabiam a árdua e perigosa
tarefa a ser enfrentada. Outras unidades policiais já tinham tentado idêntica
façanha nos anos anteriores. Os resultados foram frustrantes.
“Maior que a tristeza de não haver vencido é a
vergonha de não ter lutado !” Rui Barbosa
“Matemático” colecionava óbitos de policiais, fato infelizmente desconhecido pela sociedade
em razão do pouco caso dado pelas vozes “pensantes” a vida desses homens. Nesse
tópico vale abrir um pequeno parênteses para transcrever as palavras de Luciano Rinaldi no caderno
Opinião do Jornal O Globo do dia 13/03/14.
Optando pelo título “Indiferença diante
da morte”, o autor da matéria alerta:
“(...) o povo não pode ser indiferente ao
assassinato de um agente público. A morte de um policial deveria causar comoção
popular muito maior do que o aumento de tarifas de ônibus.(...) nossa escala de valores morais está deturpada. A apatia é alarmante e nos enfraquece
enquanto nação que busca, ou deveria buscar, a maturidade
democrática (...)” (grifei)
Só quem poderia chegar ao local hostil para
enfrentar essa quadrilha criminosa pesadamente armada seria uma tropa de elite
altamente preparada e formada por homens corajosos.
"O Exército pode passar cem anos sem ser
usado, mas não pode passar um minuto sem estar preparado.” Rui Barbosa.
Sem alternativas, os órgãos de inteligência, já
mapeando as ações criminosas de “Matemático” e sua quadrilha
durante meses, viram na equipe do SAER a única alternativa para fazer cessar aquela onda de
violência.
Esses homens foram lá e fizeram o que tinham e podiam fazer e
agora, nós, do conforto dos nossos gabinetes e lares promovemos a pior das
covardias.
Dar soluções, palpitar
e criticar daqui é fácil, aconchegante, admite correções, dias de meditação. Agora, fazer isso sentado em mais de 300
litros de combustível altamente inflamável, levando tiros de diversos pontos,
altamente vulneráveis é coisa que por si só reclama, de nós enquanto sociedade, um mínimo de respeito, admiração e gratidão.
Foi muito vil de nossa parte dar como resposta o
que foi feito. Cessado o caos, tratou-se de jogar esses homens aos leões, como
meras peças de reposição desprezíveis!
Jogamos baixo enquanto sociedade porque eles não
foram convidados para ir ao olho do furacão. Lá eles foram simplesmente porque acreditam no que fazem por nós.
“Aqueles que jamais subiram morros, favelas, ou
sequer conhecem de perto os antros frequentados por marginais, e que se
enclausuram em seus gabinetes sem que nunca tenham participado de tiroteio,
seja no estrito cumprimento do dever legal ou também em legítima defesa, não
devem se apegar com antolhos do texto gélido da lei, distante do calor dos
acontecimentos e A salvo de gravíssimos riscos, na busca do enfraquecimento ou
do desestímulo das atividades da Polícia Judiciária, em toda sua plenitude.”
(Mário Portugal Fernandes Pinheiro – Procurador de Justiça do Ministério
Público do Estado do Rio de Janeiro).
Acrescente-se que lá chegando fizeram valer justamente o foi
determinado pelo Código de Conduta para os Funcionários Responsáveis pela
Aplicação da Lei, tal como adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas, no
dia 17 de dezembro de 1979, através da Resolução nº 34/169, verbis:
“(...) Art.
1º Os funcionários responsáveis pela aplicação da lei devem sempre cumprir o
dever que a lei lhes impõe, servindo
a comunidade e protegendo todas as pessoas contra atos ilegais em
conformidade com o elevado grau de responsabilidade que a sua profissão requer
(...)” (grifei)
Não se constrói uma sociedade justa,
equilibrada, decente e segura, desmoralizando e menosprezando todos os que por
nós correm sacrifícios. Eis a fórmula das grandes potenciais mundiais!
Recentemente lendo o livro Não há dia fácil – um líder da tropa de
elite americana conta como mataram Osama Bin Laden – do autor Mark
Owen, tive mais uma vez a certeza do quão necessárias são as tropas de elite
para a reorganização do caos.
Enquanto aqui patriotas são apedrejados por
tentar resgatar partes do território tomadas pelo crime, lá os agentes são
prestigiados, elogiados e ouvidos. Isso prova o quão pequenos ainda somos e
quão distante ainda estamos de uma sociedade melhor.
“O que me preocupa não é o
grito dos maus. É o silêncio dos bons.”
Martin Luther King
A materialidade,
já disse, está estampada nos autos, entretanto, no tocante aos indícios de autoria, as filmagens
trazidas de forma tão alarmante aos autos (fl.109) e o laudo das imagens
promovido as fls. 14/48 apenas reiteram, peço venia mais uma
vez a visão externada pelo MP as fls. 03/16, as provas técnicas do inquérito
outrora arquivado!
Havia sim uma intensa troca de tiros e os
criminosos alvejavam a aeronave que, por sua vez, reagia com as suas armas dita
agressão.
As imagens e a própria avaliação do laudo
produzido pelo MP comprovam a
iminência de agressão. Veja-se para tanto o contido a fl. 39.
Em dado momento afirmam os peritos do MP,
destacando as palavras dos policiais o seguinte:
“Colocaram o bico para fora”.
“Bico”, no jargão criminoso e/ou policial significa fuzil. Portanto, ao
por “o bico” para fora do veículo os criminosos puseram em risco não só os policiais como também a
sociedade, pois evidenciaram a disposição de efetuar disparos.
Outra prova da disposição dos criminosos em
enfrentar o Estado está a fl. 46, onde os peritos ministeriais constatam a presença de vários criminosos fortemente
armados.
A iminência
dos disparos já é mais do que suficiente para dar partida à ação neutralizadora
da policia, pois não é
razoável se imaginar alguém primeiro ser alvejado por tiros de
fuzil para só então reagir.
William Douglas, por exemplo, externa muita
preocupação com esse conceito e seus reflexos, motivo pelo qual chega a
denominá-lo de legítima defesa “antecipada”. Diz o mestre:
“Com quase simplismo, rejeita-se a justificante
em tela como amparo às pessoas citadas, por não existir agressão atual ou
iminente, mas futura.
(....) Na agressão, condição para
a legítima defesa preventiva, o evento é futuro e certo.” (In. Ensaios
Críticos sobre Direito Penal e Direito Processual Penal, p. 3-4 – grifei)
Seja: “preventiva”, “antecipada” ou
“iminente”, a legitima defesa em hipóteses como a presente deve ser sempre
prestigiada, ainda mais quando se tem de um lado um sociopata, assassino
contumaz como “Matemático” e, de outro, homens dignos e honrados,
membros da mais apurada elite policial brasileira.
A jurisprudência pacífica dos nossos Tribunais
não me deixa mentir:
“Em tema
de legítima defesa não há indagar se a agressão poderia ser prevenida ou
evitada sem perigo e desonra. A lei penal não pode exigir que, sob a
mascara da prudência, se disfarce
a renúncia própria dos covardes ou dos animais de sangue frio. Em face
de uma agressão atual (ou iminente)
e injusta, todo cidadão é
quase como um policial e tem faculdade legal (além do dever moral) de
obstar incontinenti ex exproprio Marte ao exercício da violência ou atividade injusta.” (RT: 624/303 -
grifei).
“É de todo indiferente a legitima defesa a possibilidade de fuga do agredido. A lei
não pode exigir que se leia pela cartilha dos covardes e pusilânimes.”
(RT: 474/297 – grifei).
“Age em legitima defesa quem, na iminência de ser agredido a faca pela
vítima, pessoa belicosa e temível, nela desfecha tiros de revólver, matando-a.” (RT:529/332 – grifei)
“Sendo a prova dos autos direcionada num único
sentido, a demonstrar, de forma inequívoca, que o réu agiu sob o pálio da
legítima defesa ao atira contra a vítima, que, munida de um facão, passou a
proferir-lhe ameaças, assim como a seu colega, a absolvição sumária é medida
que se impõe.” (JCAT: 95/377 – grifei).
O conceito moderno de ação policial abomina a reação, pois quem “reage”; age
atrás, ou seja, já
está em desvantagem. Portanto, o agente público que aguarda a conduta
criminosa para só então atuar, deve
ser incisivamente responsabilizado por ter posto em risco a vida
dele e de toda a sociedade, conduta
inaceitável para quem tem
o dever de evitar o mal.
A própria Portaria nº 4226/11 do Ministério da
Justiça, norma regulamentadora do emprego de arma de fogo por policiais no
Brasil, autoriza o emprego de
força letal no caso ora enfrentado. Vejamos:
“Os agentes de segurança pública não deverão
disparar armas de fogo contra pessoas, exceto em casos de legítima defesa própria ou de terceiro
contra perigo iminente de
morte ou lesão grave.”
“Comentário nº 1: Correto. A vontade de matar é
uma característica que distingue os criminosos dos policiais profissionais. E quando esses policiais disparam suas armas,
isso é feito com a intenção de parar imediatamente uma ação criminosa que
oferece perigo de morte. Mas como a arma de fogo é um instrumento letal por natureza, seu uso pode provocar
a morte do criminoso, pois não existe um modo menos letal para usá-la. A
intenção de parar imediatamente um delinquente não tem relação com atirar para
matar, pois a autodefesa policial está centralizada na percepção da capacidade
do criminoso matar ou tentar matar o policial. Assim, se a simples presença da
arma detiver a intenção do agressor, o trabalho está feito! Se alguns tiros
convencerem o atacante a desistir, está ótimo! Contudo, se for necessário aumentar o nível de força
porque o perigo persiste, então é o que deve ser feito.”
“Não é legítimo o uso de armas de fogo contra
pessoa em fuga que esteja
desarmada ou que, mesmo na posse de algum tipo de arma, não represente risco imediato de
morte ou de lesão grave aos agentes de segurança pública ou terceiros.”
“Comentário nº 2:Correto. O uso da arma de fogo
é legítimo contra o perigo
iminente de morte ou lesão grave. Alguém DESARMADO que FOGE não pode
representar tal nível de perigo para o policial. E mesmo que ele apenas possua
uma arma, o perigo ainda não é imediato, apesar de real. Entretanto, a diretriz é clara quando informa que a arma
é um recurso viável quando o sujeito em fuga representa risco imediato. Assim,
parece ser aquela situação na qual o delinquente atira enquanto corre da
polícia ou atira em outras pessoas em seu caminho com o objetivo de atrasar a
perseguição policial.” ( In. Sobrevivência Policial Porque Morrer
Não Faz Parte do Plano, localizável no site:
comunidadepolicial.blogspot.com.br/2011/01/o-que-ha-de-certo-e-errado-na-portaria.html
-grifei)
“Matemático” e sua trupe foram instados a se entregar,
entretanto, por arrogância e vaidade aceleraram seus carros e motos, efetuando
disparos nas vias públicas.
“Tende cuidado, vossa violência vos tira o poder
de defesa.”
Samuel Richardson
Enfim, escolheram seus destinos e, no caso de “Matemático”, sua arrogância lhe
impôs o preço por enfrentar uma equipe policial bem preparada, estruturada e capaz de dar resposta na medida
devida!
Fica a lição! Estado
não se desafia; se respeita!
Frases e palavras empregadas por policias não podem e/ou devem ter
relevância dada no desarquivamento, até porque cada tribo tem seu linguajar,
seus vícios de linguagem. O próprio MP, advocacia e o Judiciário já foram alvo
de severas críticas por conta do “juridiquês”!
Os agentes estavam sob forte estresse, em
situação gravíssima, atuando contra criminosos contumazes e dispostos a tudo.
Querer deles um linguajar escorreito e cheio de cercanias honradas e pausadas
é, no mínimo, uma demonstração nossa de alienação da realidade.
Pouco importa o que falaram sentimentos
externados ou xingamentos eventuais, importa sim a prova técnica colhida pela Presentante do MP de ponta.
Esta prova demonstra incontinenti
uma grave situação onde, toda a legislação autorizava o emprego de
força letal.
Voe SAER, volte a sua plenitude. A sociedade
chora seus decentes, se se lamuria pela perda de mando, intimida-se pelas
agressões dos “Matemáticos” da vida!
Vocês continuam sendo, tal como inúmeros outros,
nossa esperança de resgate da cidadania. Nosso sonho de caminhar livres e
faceiros com nossos filhos pelas vias da nossa ex-cidade maravilhosa!
Amanhã e todos os dias gostaríamos de acordar e
saber que poderemos subir nos coletivos, trafegar nos nossos veículos,
desfrutar nossas praias, almoçar, jantar e curtir todos os espaços sempre com a
certeza que acima de nós Deus e seus anjos negros, nas suas máquinas voadoras
lá estão prontos para nos deixar viver!
Nós precisamos de vocês! Pagamos, ricos ou
pobres, independentemente de raça, cor e credo, nossos impostos e temos
direitos! Amamos vocês! Somos a parcela amordaçada e leal a vocês! Vão lá e
façam de novo a diferença, estamos gritando por vocês! Amém!
Por todo o exposto e
por estar convicto de que a ação dos investigados não constitui crime, DETERMINO
O ARQUIVAMENTO com base no Art. 23, III do CP c/c Art. 395, III do CPP.
Dê-se baixa imediatamente e arquive-se,
encaminhando-se cópia da presente decisão à Chefia de Policia Civil do Estado
do Rio de Janeiro, a qual deverá
fazer constar elogio deste Juízo nas folhas funcionais dos investigados, objetivando amenizar os graves
danos já causados aos mesmos.
Determino ainda, como
forma de ainda minorar o vexame público dos agentes, que o Sr. Chefe de Polícia
publique no boletim interno da sua briosa Corporação Policial a presente
decisão.
P. R. I. C.
Rio de Janeiro, 26 de março de 2014.
Alexandre Abrahão Dias Teixeira
Juiz de Direito