terça-feira, 11 de novembro de 2014

ÓRGÃO ESPECIAL DO TJRJ DIZ QUE JUIZ AGIU DENTRO DA LEI QUANDO FOI PARADO EM BLITZ DA LEI SECA


TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
ÓRGÃO ESPECIAL
PROCESSO ADMINISTRATIVO Nº 0029675-23.2011.8.19.0000
REQUERENTE: EXMO. SR. DESEMBARGADOR CORREGEDOR GERAL DO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
REQUERIDO: JUIZ DE DIREITO

PAD - Art. 35 em seus incisos I e VIII da LOMAN. PAD instaurado a partir de representação oferecida em face do Dr. Juiz João Carlos de Souza Correa, onde noticia fato ocorrido em 14/02/2011, cerca de 01:00h, onde a Representante trabalhava na denominada Operação Lei Seca. Policiais sinalizaram para que o Magistrado parasse o veículo que conduzia e, então, verificou-se que não portava a CNH e a documentação do veículo, bem como que estava vencido o prazo para emplacamento. Do exame dos autos conclui-se que o Representado, com seu proceder, não violou qualquer dispositivo da LOMAN (Lei Orgânica da Magistratura). A alegada violação ao inciso I do art. 35 decorre com toda certeza de equívoco de quem o invocou. Quanto ao inciso VIII do art. 35 a análise isenta e minuciosa dos autos às escancaras evidencia não ter o Representado adotado postura que consista violação à exigida conduta irrepreensível pelo Magistrado, tanto na vida pública como no particular. A Representante limitou-se a dizer que confirmava o teor da representação e as declarações prestadas em sede policial. Gize-se que não consta nem da assentada, nem de seu depoimento, o registro de que fora lido para a Representante o que declarara em sede policial. Resumindo: o depoimento da Representante não tem valor probatório algum, porque nada explicita sobre os fatos! O M.P. opina pela punição do Magistrado e, embora admita que há relatos de testemunhas presenciais que noticiam conduta desrespeitosa, descortês e arrogante por parte da Representante, finda por afirmar que tal conduta não se configurou. Alegações finais apresentadas pelo MP, data vênia, não apontam que elementos de prova presentes nos autos autorizam dita manifestação pela punição do Magistrado. Não há adminículo de prova que autorize a assertiva de ter o Magistrado violado deveres inerentes à Magistratura. Não houve resistência alguma pelo Representado. Extrai-se da prova coligida que, retornando do plantão judiciário da Comarca em que era titular, tinha no veículo vários processos que estavam sob sua responsabilidade e daí ponderara que o veículo não poderia ser levado dali direto para o depósito público, pois precisava retirar os processos e acomodá-los em outro veículo. A partir de tal ponderação feita pelo Magistrado, começou o comportamento desrespeitoso da Representante, manifestando-se mesmo com expressões como “Juiz não é Deus” e adotando postura irônica e acintosa. Cabe registrar que o Magistrado submeteu-se sem qualquer resistência ao exame do “bafômetro”, tendo tido como resultado ZERO de álcool nos pulmões. A hipótese é aquela prevista no art. 232 do CTB = conduzir veículo sem os documentos de porte obrigatório (certificado de licenciamento anual; CNH; comprovante de pagamento do IPVA e DPVAT), infração de natureza leve, duplamente apenada com multa e retenção do veículo até a apresentação da referida documentação. A conduta em que incidira o aqui Requerido tem natureza leve e não realiza a figura típica do art. 309 do CTB, pois ali sim se trata de quem é flagrado na direção de veículo sem ser habilitado para tanto. As testemunhas Antonio Carlos, Robson Pires e Almir Peixoto fazem certo o comportamento desrespeitoso da Representante para com o Representado. Contexto probatório reunido nos autos evidencia não ter o Magistrado adotado qualquer conduta que constitua violação ao decoro, ao pundonor ou aos deveres a serem observados pelos integrantes da Magistratura. PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR IMPROCEDENTE.
RELATÓRIO E VOTO NO PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR Nº 0029675-23.2011.8.19.0000
O presente PAD foi instaurado a partir de representação oferecida por Luciana Silva Tamburini em face do Dr. Juiz João Carlos de Souza Correa, onde noticia fato ocorrido em 14 de fevereiro de 2011, cerca de 01:00h, onde a Representante trabalhava na denominada Operação Lei Seca.
Informa que os policiais militares sinalizaram para que o Magistrado parasse o veículo que conduzia.
Indagado se concordava em submeter-se ao teste do bafômetro, aquiesceu, obtendo resultado de nível zero nos pulmões. A seguir verificou-se que não portava a CNH e a documentação do veículo.
Constatou-se, ainda, que estava vencido o prazo para emplacamento. A seguir, apresenta a Representante sua versão para os fatos, culminando por enquadrar a conduta do Magistrado Representado em dispositivo da Lei de Abuso de Autoridade, qualificando os fatos que noticia como “praticas tão danosas e que só denigrem a imagem do Poder Judiciário” (fls. 03/05).
Com a inicial da Representação vieram cópias de reportagens jornalísticas referentes ao Magistrado/Representado (fls. 06/11) versando sobre assuntos diversos daquele tratado na Representação.
A testemunhal colhida encontra-se às fls. 263 (Luciana): 264 (Leandro Carlou); 265 (Allan Frank das Silva); 266 (Marcelo Abel da Rocha); 267 (Sérgio Ricardo de Lima Alves); 269 (Alice); 270 (Antônio Carlos); 271 (Robson Pires); 276 (Almir Peixoto Freitas); 277/278 (depoimento do Representado).
Alegações finais do Ministério Público = fls. 298/306.
Do exame do que os autos constam conclui-se que o Representado, com seu proceder, não violou qualquer dispositivo da LOMAN, relevando notar que imputava-se nesse feito a violação do art. 35 em seus incisos I e VIII. E qual a letra do art. 35 e incisos I e VIII?
Art. 35 - São deveres do magistrado:
I - Cumprir e fazer cumprir, com independência, serenidade e exatidão, as disposições legais e os atos de ofício;
VIII - manter conduta irrepreensível na vida pública e particular.
A alegada violação ao inciso I do art. 35 da LOMAN decorre com toda certeza de equívoco de quem o invocou.
E quanto ao inciso VIII do art. 35 a análise isenta e minuciosa dos autos às escancaras evidencia não ter o Representado adotado postura que consista violação à exigida conduta irrepreensível pelo Magistrado, tanto na vida pública como na particular. A leitura dos depoimentos colhidos pelo culto Magistrado designado para tal (Juiz Alexandre de Carvalho Mesquita – decisão do Des. Relator às fls. 198) espanca qualquer dúvida a respeito. - Luciana Silva Tamburini (fls. 387) limitou-se a dizer que confirmava o teor da representação e as declarações prestadas em sede policial. Mas em resposta à pergunta formulada pelo representante do M.P. asseverou “que o tenente Carlos ratificou integralmente a conduta da depoente no episódio”.
Gize-se que não consta nem da assentada de fls.262, nem do depoimento de Luciana às fls.263, o registro de que fora lido para a Representante o que declarara em sede policial. Tal proceder caracteriza falha, d.v., por parte do Magistrado que presidia a coleta de depoimentos, pois a inquirição sobre os fatos por ela noticiados era obrigatória, até para que, com lastro em seu relato, fossem formuladas questões que evidenciassem o que de fato ocorreu. Daí, resumindo-se o depoimento da testemunha Luciana (cuja representação ensejou a deflagração desse processo administrativo) a mera afirmação de que reiterava o que dissera anteriormente (tanto na representação como em sede policial) o que se vê no “depoimento” de fls.263 não tem valor probatório algum, porque nada explicita sobre os fatos!
Tenente Carlos em seu depoimento de fls. 388 asseverou: “que não se recorda de ter defendido a conduta de Luciana para a autoridade policial”. E, igualmente, consignou-se que reiterava o depoimento prestado em sede policial. Dito depoimento nada explicita sobre o que realmente ocorrera.
Consta ainda que a Representante Luciana contou com apoio na D.P. dos colegas e aqui testemunhas Leandro; Allan Frank; Marcelo Abel da Rocha; Ricardo de Lima Alves. Verifica-se, pois, em resumo, que em prol da funcionária que atuava na blitz da Lei Seca um verdadeiro aparato de colegas compareceu à D.P., inclusive dois deles que nada presenciaram, pois sequer estiveram no local dos fatos. Qual o motivo de serem, via telefone, chamados? Prestar solidariedade à Luciana? Era necessária a presença de colegas de trabalho da Representante? São indagações que restam sem resposta, mas que evidencia a existência de aparato previamente ajustado para o caso de desentendimentos quando da realização da blitz da Lei Seca, envolvendo funcionários do Detran, policiais e motoristas “parados” na blitz.
O M. P. opina pela punição do Magistrado e, embora admita que há relatos de testemunhas presenciais que noticiam conduta desrespeitosa, descortês e arrogante por parte da Representante Luciana, finda por afirmar que tal conduta não se configurou.
Em sua manifestação final o representante do MP argui em preliminar a inversão dos atos processuais, aduzindo que a manifestação do MP em alegações finais deveria ser posterior às alegações finais apresentadas pela defesa do Representado.
Quanto ao mérito, sustenta que o Magistrado, ao se insurgir contra a informação de que seu veículo seria apreendido e encaminhado ao depósito público, adotara comportamento inadequado na vida particular.
Daí opina pela imposição de sanção disciplinar adequada às circunstâncias do caso.
Examinadas as alegações finais apresentadas pelo Ministério Público, data vênia, constata-se que não apontam que elementos de prova presentes nos autos autorizam dita manifestação pela punição do Magistrado.
O cotejo entre o teor das alegações finais do MP e a prova reunida nos autos informa que não há adminículo de prova que autorize a assertiva de ter o Magistrado violado deveres inerentes à Magistratura.
A manifestação ministerial não aponta elementos de prova que evidenciem proceder passível de reprimenda pelo Juiz Representado.
Permito-me ter como vagas as referências que diz o MP que demonstram sobejamente a necessidade de imposição de sanção disciplinar. Refere-se à forma como reagira o Magistrado diante de decisão de ser apreendido e encaminhado seu veículo ao depósito público. Mas que prova dos autos permite
tal conclusão? As alegações finais do MP nada apontam, no particular.
Tenho por equivocada a análise consignada no último parágrafo de fls.429, porque não houve resistência alguma pelo Representado e isso se afirma com lastro na testemunhal produzida nos autos, em especial, os depoimentos das testemunhas Antônio Carlos da Silva Macedo; Robson Pires Vianna e Almir Peixoto Freitas, todos amplamente favoráveis ao Magistrado.
Vejam-se os depoimentos de cada qual:
“... que quando por ocasião dos fatos o depoente se encontrava parado na operação Lei Seca, uma vez que presta serviço de segurança para a testemunha Sueli e seu carro estava sem documentos; que Sueli chamou sua atenção pela forma como a testemunha Luciana se dirigia ao representado, mormente pelo fato do mesmo ser um juiz; que acredita que Sueli soubesse que o representado era juiz em razão do mesmo ter se identificado; que ao que se recorda o veículo do representado estava sem placa; que não se recorda se o representado estava ou não sem habilitação (...) que se recorda de Luciana ter dito ao representado que, como juiz, deveria conhecer a lei; que Luciana se comportava de forma irônica para com o representado; que se recorda do representado ter dito a Luciana que estava com vários processos de sua responsabilidade dentro do carro, e que se algum deles sumisse lhe daria voz de prisão; que o tratamento dado pelo representado a Luciana era respeitoso”. (Antônio Carlos da Silva Macedo – fl. 270).
“... que a testemunha Luciana estava tratando o representado de forma irônica e sem educação; que em contra partida o tratamento dado pelo representado para Luciana era de extrema educação; que o tratamento dado por Luciana era descortês não apenas pelo fato do representado ser juiz, mas assim seria em relação a qualquer pessoa; que em momento algum o representado perdeu o controle; que não houve determinação do representado para que Luciana fosse na viatura policial para a delegacia”. (Robson Pires Vianna – fl. 271).
“... que em alguns momentos os funcionários do DETRAN que trabalhavam na Lei Seca se mostraram arrogantes; que o comportamento do representado para com os mencionados agentes sempre foi de cortesia (...) que a funcionária do DETRAN, cujo nome não se recorda, disse que o representado era Juiz, mas não era Deus...”. (Almir Peixoto Freitas – fl. 276).
Extrai-se da prova coligida que, retornando do plantão judiciário da Comarca em que era titular, tinha no veículo vários processos que estavam sob sua responsabilidade e daí ponderara que o veículo não poderia ser levado dali direto para o depósito público, pois precisava retirar os processos e acomodá-los em outro veículo. A partir de tal ponderação feita pelo Magistrado, começou o comportamento desrespeitoso da Representante, manifestando-se mesmo com expressões como “Juiz não é Deus” e adotando postura irônica e acintosa.
Impressiona igualmente a chegada ao local dos fatos da imprensa, como sempre acontece, aliás, quando o motorista parado na blitz da Lei Seca tem algum entrevero com seus integrantes. Basta para a imprensa ser chamada ao local ser o motorista Magistrado ou Artista. A exposição indevida e abusiva da imagem e do bom nome da pessoa logo é providenciada pelos que da blitz participam.
Conduta reprovável e que deveria ser evitada pelo servidor público que não tem o direito de convocar a imprensa para expor à execração quem quer que seja.
As alegações finais do Magistrado encontram-se às fls.310 a 316, aduzindo não restar configurada qualquer violação a dispositivos da LOMAM e que, por via de consequência, a improcedência do processo administrativo disciplinar é a única solução possível.
Examinando-se os autos constata-se que o Magistrado submeteu-se sem qualquer resistência ao exame do “bafômetro”. O resultado foi ZERO de álcool nos pulmões. E, como já se disse, noticiam os autos a resistência dos agentes participantes da blitz da Lei Seca em fornecer ao Magistrado o resultado do exame procedido por ele.
A informação prestada pelas testemunhas de nome Leandro e Luciana dando conta que a apreensão do veículo se deu em razão de estar dito veículo em situação irregular (licenciamento provisório vencido)
A hipótese é aquela prevista no art. 232 do CTB = conduzir veículo sem os documentos de porte obrigatório (certificado de licenciamento anual; CNH; comprovante de pagamento do IPVA e DPVAT). Infração de natureza leve, duplamente apenada com multa e retenção do veículo até a apresentação da referida documentação.
Na obra “Comentários ao Código de Trânsito Brasileiro”, ed. Revista dos Tribunais, 6ª edição, p.480, assim analisa Arnaldo Rizzardo o teor do art. 232, caput:
“Conduzir veículo sem os documentos de porte obrigatório referidos neste Código.
Infração: leve
Penalidade: multa
Medida administrativa: retenção do veículo até a apresentação do documento.”
Vê-se, portanto, que a conduta em que incidira o aqui Requerido tem natureza leve e não realiza, de modo algum, a figura típica do art. 309 do Código de Trânsito, pois ali sim se trata de quem é flagrado na direção de veículo sem ser habilitado para tanto.
Esclareça-se que a testemunha Allan Frank da Silva (fls. 265) informa que chegou ao local da blitz da Operação Lei Seca atendendo chamado por telefone por Leandro Carlos porque há necessidade da presença de um oficial da PM na operação Lei Seca e “o depoente se dirigiu para cobrir a ausência da testemunha Leandro Carlos”. Ou seja, de ciência própria, nada sabia.
O mesmo se diga quanto à testemunha Marcelo Abel da Rocha (fls. 266) que informa “o depoente foi chamado por telefone pela testemunha Leandro Carlos”.
Em resumo: a nada assistiu, pois chegou depois.
A testemunha Sergio Ricardo de Lima Alves (fls. 267): admite estar presente na operação, mas que foi o coordenador militar que acompanhou o procedimento envolvendo o Representado do início ao fim e que ele só acompanhou a ocorrência da metade para o final.
Já o teor dos depoimentos das testemunhas Antônio Carlos da Silva Macedo (fls. 270); Robson Pires Vianna (fls. 271) e Almir Peixoto Freitas (fls. 276) fazem certo o comportamento desrespeitoso da Representante para com o Representado.
Ante o exposto à vista do contexto probatório reunido nos autos que evidencia não ter o Magistrado adotado qualquer conduta que constitua violação ao decoro, ao pundonor ou aos deveres a serem observados pelos integrantes da Magistratura, a única solução possível in casu é julgar-se IMPROCEDENTE o processo administrativo disciplinar.
É o voto.
Rio de Janeiro, 12 de Agosto de 2013.
Desa. GIZELDA LEITAO TEIXEIRA
Designada para o acórdão

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